1982-2002

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Desorientação na agenda

Governo, Congresso e partidos políticos mergulharam num processo que se caracteriza pela perda da noção da agenda real do país. Mesmo os pontos substântivos que permanecem na ordem do dia, como é o caso da reforma, foram desfocados do seu cerne para questões secundárias. No caso da reforma da Previdência, a partir do substitutivo de Michel Temer, as mudanças propostas são meramente periféricas e perdeu o sentido de se falar numa verdadeira reforma. De modo geral, os privilégios estão mantidos e o sistema previdenciário continua correndo riscos de falência.

A proposta do governo para a reforma Administrativa proporcionou que a discussão se concentrasse em torno da demissão de funcionários. Perdeu-se de vista o objetivo de transformar o modelo de gerenciamento do Estado para produzir uma maior excelência na prestação de serviços públicos e na garantia de direitos dos cidadãos. A reforma Tributária, que deveria ser a mãe de todas as reformas para dar conta do grave problema do déficit público, foi relegada a um segundo plano e tudo indica que sequer entrará em votação neste ano. Com a falta de regulamentação das reformas da Ordem Econômica, o seu efeito se retarda mantendo inalterada a realidade em relação à situação anterior à sua aprovação.

Por outro lado, na relação entre governo e Congresso, o debate sobre o conteúdo das reformas foi substituído pelo debate em torno das barganhas fisiológicas, em torno da infidelidade da base governista e em torno das disputas por espaços entre os partidos do condomínio governamental. A recente reforma ministerial não passou de um mero arranjo neste condomínio, que terminou por gerar mais confusão do que soluções.

O debate sobre os rumos do Plano Real e da estabilização econômica passa ao largo do Congresso, com exceção de alguns deputados-economistas. A posição do governo sobre este tema é vergonhosa e visa enganar e confundir a opinião pública. Enquanto o presidente Fernando Henrique e o ministro das Comunicações Sérgio Motta fazem uma mise-en-scêne pública atacando as taxas de juros, os seus cabos-de- guerra na Economia, Pedro Malan e Gustavo Franco, sustentam em todos os fóruns que as atuais taxas de juros são decisivas para a preservação do Real e o controle da inflação. Como pode o cidadão comum compreender e confiar num governo que age desta maneira? Enquanto isto, os temas do desemprego, do crescimento econômico, do poder aquisitivo e de uma política industrial passam à margem das preocupações cotidianas e das formulações estratégicas do governo e do Congresso.

O Brasil precisa recuperar sua agenda real centrada em quatro pontos:

1) Reordenação da política econômica com prioridade para o emprego e o crescimento econômico e revisão da política de juros e câmbio. A estabilização econômica deve estar a servico destes objetivos. Hoje ela foi transformada em fim em si mesmo.

2) Reorientação das reformas constitucionais, com prioridade para a reforma Tributária. Quanto à reforma da Previdência, Congresso, governo e partidos deveriam partir de um novo ponto que adotasse como princípio a instituição de uma aposentadoria universal básica para todos, com um teto de dez salários mínimos e o fim das aposentadorias privilegiadas. A reforma Administrativa também deveria começar com uma nova perspectiva que visasse criar um novo modelo de gestão pública com vistas a democratizar o acesso dos cidadãos aos serviços e bens públicos.

3) É fundamental que o país adote um programa social de emergência, principalmente nas áreas de saúde, educação, habitação e assistência social para atenuar os efeitos da crise e da exclusão social.

4) O governo precisa implementar urgentemente as medidas mais ou menos consensuais no âmbito da reforma agrária e, em paralelo, adotar uma política agrícola que financie e incentive a agricultura familiar.

É preciso registrar ainda que o governo e os partidos governistas estão imprimindo um conteúdo equivocado e enganador à agenda das eleições municipais. A insistência do governo em colocar na ordem do dia o tema da reeleição faz com que o debate das campanhas se desloque da discussão de alternativas e soluções dos problemas dos municípios para a sucessão presidencial de 98. As eleições municipais passam a ser instrumentalizadas, assim, como mero momento de acúmulo de forças para a disputa sucessória.

A falência dos partidos e do sistema político está fazendo que com que a disputa política tenha como objetivo exclusivo o poder. A discussão programática, as estratégias para o país e as soluções para os problemas sociais perdem relevância. Os políticos estão se apartando cada vez mais da sociedade e prova disto é a reprovação das instituições políticas, principalmente do Congresso, captada pelas pesquisas. A perda de confiança das pessoas no governo e nas instituições é um sintoma claro de que os políticos estão desorientados e perderam a noção da agenda real do país.

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