1982-2002

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“São Paulo pode e tem potencialidade para voltar a crescer”

 

Ele é o deputado federal mais antigo da bancada do PT e um dos políticos mais respeitados no Congresso Nacional. José Genoino Neto, cearense de Quixeramobim, “terra de Antonio Conselheiro” como gosta de lembrar, foi reeleito em 98 para o seu quinto mandato com a votação histórica de 307 mil votos. Agora, este filho de lavrador, que participou da guerrilha do Araguaia e foi preso político por cinco anos, está se preparando para mais um desafio: é pré candidato do PT ao governo do Estado de São Paulo.

Com uma trajetória de vida marcada pela luta em defesa da democracia e da justiça social, José Genoino fala nesta entrevista sobre corrupção, crise energética e as propostas do partido para o governo paulista.Sindiquim - A corrupção marca profundamente a história do Brasil. A oposição está conseguindo quebrar essa estrutura ou só está alcançando os “pequenos” corruptos?

Genoino - A corrupção no Brasil mata, porque o dinheiro que vai para a corrupção é o dinheiro que falta nas escolas, na segurança, nos hospitais, na geração de empregos. A corrupção no Brasil é também histórica e estrutural, um setor da elite brasileira sempre se viabilizou economicamente através de um processo perverso de transferência de renda do setor público para o setor privado. A corrupção no Brasil é uma marca econômica, o Brasil é um país rico (nós somos a 9º ou a 10º economia do mundo em PIB – Produto Interno Bruto), mas nós temos os piores índices sociais, isso quer dizer que o Brasil é rico mas tem uma péssima distribuição de renda, uma péssima divisão da propriedade. A corrupção também desagrega e desacredita as instituições públicas, porque no Brasil nem todos são iguais perante a lei, quem pode pagar um bom advogado não fica muito tempo na cadeia.

Nós temos tido algumas vitórias parciais, de algumas CPIs. Na verdade, às vezes detectamos os focos mas não conseguimos fazer uma verdadeira assepsia. Eu acho que isso não depende só da influência política dos partidos de esquerda, mas também da sociedade, da pressão popular, da vigilância, da fiscalização.

Sindiquim - Quem são os responsáveis pelas crises energética e do abastecimento de água?

Genoino - O maior responsável é o modelo que transforma tudo em mercadoria e lucro. A geração de energia e a distribuição e tratamento da água não podem ser objetos de privatização nem de lucro porque são bens fundamentais para a vida das pessoas. O segundo responsável é o governo porque não planeja, não antecipa, não prevê e não é capaz de se antecipar a possibilidade da crise energética.

A causa dessa crise é a falta de investimento em geração e transmissão de energia, falta de investimento na co-geração de energia, nas termoelétricas e na energia do bagaço da cana, e é também uma crise por que o modelo econômico que governa o Brasil concebe tudo pela lógica do ajuste fiscal, pela lógica dos acordos com o Fundo Monetário Internacional, desprezando as necessidades do país e do povo brasileiro. Essa crise revelou quem ganhou e quem perdeu com a privatização, por isso sabiamente a maioria do povo brasileiro hoje critica o modelo de privatização no Brasil.

Sindiquim: O PT tem propostas para solucionar essas crises?

Genoino - O PT tem propostas sim. Em primeiro lugar é necessário apoiar essa consciência cívica do povo brasileiro de economizar energia, o povo está dando um baile nas autoridades, mas só economizar energia não resolve porque podemos ter o apagão. É necessário reinvestir na geração da energia elétrica e na co-geração de energia. É necessário que as empresas concessionárias de energia possam também colaborar com a população, principalmente com a população de baixa renda, fornecendo condições para a economia de energia. Temos que ter um planejamento do poder público com exclusividade na geração de energia e, em parceria com a iniciativa privada, na transmissão e na distribuição para garantir tarifas e condições de trabalho exeqüíveis para a população. O centro das nossas propostas é ter um planejamento para reinvestir aquilo que é necessário para a geração de energia. A causa da crise energética é a causa da geração e o que acontece na distribuição e transmissão é decorrência. No caso brasileiro a geração de energia tem que ser de controle público porque nossas usinas são usinas de múltiplas funcionalidades, elas têm função de gerar energia mas também têm funções para a agricultura, saneamento, transporte , lazer, piscicultura etc. Não podemos deixar que as nossas bacias hidráulicas sejam submetidas apenas à lógica do mercado atacadista de energia.

Sindiquim - Qual o grau de importância das eleições de 2002?

José Genoino - É uma eleição que vai fazer o ajuste de contas com o modelo que vem predominando no Brasil desde a eleição do Collor e principalmente com a vitória de FHC em 94 e 98. Nela vai estar em julgamento o modelo econômico e político que governou este país, que é responsável pelo desemprego, pelo apagão, pela devastação social, pela inserção subalterna do Brasil na economia globalizada. Ao mesmo tempo vai ser uma eleição na qual vamos ter oportunidade de fazer a disputa de um projeto alternativo para o país, de um projeto popular, que combine desenvolvimento econômico e distribuição de renda, democracia com combate à corrupção e inserção no mundo com autonomia e inclusão social. Acredito que será uma eleição estratégica para desenharmos o futuro do Brasil no próximo milênio.

Sindiquim - Há 500 anos as elites brasileiras se reciclam no poder. Nas próximas eleições existe de fato a possibilidade dos trabalhadores chegarem e se manterem no poder?

Genoino - A possibilidade de ganhar esta eleição existe, é real, mas não podemos jamais menosprezar a capacidade da elite de fazer casuísmos, manobras, de buscar na última hora um tipo de solução para continuar no poder. Os conservadores muitas vezes mudam sem nada mudar, noutras vezes eles dividem a oposição para continuar mandando, em outras ocasiões eles partem para o preconceito, para a difamação, para a política do vale tudo. Eu acho que eles vão partir para o tudo ou nada, mas vão ter dificuldade. O Partido dos Trabalhadores hoje é uma alternativa credenciada popularmente, é uma alternativa experiente. O ideário do PT está se misturando ao ideário da nação, portanto nós temos todas as condições de ganhar essa eleição, mas não podemos menosprezar os conservadores, não podemos ficar de “salto alto”, no “já ganhou”. O partido tem que continuar firmando o seu ideário político, o seu programa popular e o seu compromisso com uma nação que resolva o problema do crescimento econômico, da integração social, da democracia e da soberania.

Será um caminho difícil, porque uma vitória do PT significa mudanças reais no país, significa outro modelo de organização econômica, social e política, por isso não podemos deixar de levar em conta a necessidade de fazer alianças, a necessidade de interlocução com segmentos econômicos que no passado nem conversavam com o PT e hoje se dispõem a dialogar conosco. Devemos também levar em conta as nossas experiências administrativas nos estados e nos municípios. Eu acho que é um momento muito importante na história do PT, após 21 anos o futuro do PT se funde com a disputa de futuro do povo brasileiro.

Sindiquim - E a mídia? O comportamento será o mesmo das eleições anteriores?

Genoino - O povo brasileiro está mais amadurecido, mais preparado para as nossas propostas e hoje o PT já tem uma história de sucesso aonde governa e aonde legisla. A direita e o centro já mostraram o que fazem com o país, o povo já experimentou o aventureiro Collor, a ditadura militar, experimentou Sarney, Itamar, Fernando Henrique Cardoso. A mídia acaba levando em conta esse estado de espírito da população. Claro que nós vamos enfrentar uma situação adversa na mídia, mas ela não vai se comportar como nas outras eleições até porque a consciência da população está hoje muito mais evoluída, está muito mais forte, muito mais pró-PT do que em outras épocas.

Sindiquim - Como você analisa as alianças que já estão se formando para a disputa do ano que vem?

Genoino - O governo está com dificuldade de escolher um nome, que pode ser Tasso Jereissati, José Serra ou outro nome. Na oposição, diferente de outras eleições, nós teremos outros nomes além do Lula, que é o meu candidato e que deve ser o candidato do PT. Itamar Franco, Ciro Gomes e o Garotinho devem sair candidatos. Certamente as alianças vão acontecer no segundo turno. Nós não devemos aceitar bate-bocas com os candidatos da oposição, não nos interessa responder aos palavrões, às críticas de baixo nível de Garotinho e de Brizola. O que está credenciando o PT é ele ser a oposição a esse modelo e nós temos que insistir até o último momento nas alianças, se elas não acontecerem a culpa não será do PT. Temos que fazer uma campanha que resgate a amplitude e a radicalidade da história do PT , que resgate a alegria, a esperança e a auto-estima de outras campanhas.

Sindiquim - No cenário internacional, o que muda com a vitória do PT?

Genoino - O Brasil tem uma importância no mundo a partir da sua influência regional na América Latina, particularmente na América do Sul, e hoje a opinião pública mundial não está mais embalada pelo único hino do neoliberalismo, ela faz proposta, faz oposição. Nós temos condições de fazer relações comerciais e relações diplomáticas com outros centros de poder, nós temos condições de defender melhor os interesses do Brasil, nós temos condições, com essa vitória do PT, de sinalizar que a esquerda no Brasil é uma alternativa de poder, particularmente pela influência que tem o Brasil e pela credibilidade, pela força representada pelo Partido dos Trabalhadores.

Sindiquim - Você é candidato a governador de São Paulo pelo PT?

Genoino - Eu sou pré-candidato, até final de julho poderemos ter outros candidatos e, se tiver, a prévia será em outubro e em novembro teremos a oficialização do nome. Eu pretendo ser candidato ao governo de São Paulo pelo PT. Desde 98 segmentos do PT-SP sugerem minha participação em uma eleição majoritária e, considerando a votação que tive em 98, tenho a responsabilidade de disputar essa eleição. Outro motivo é que o Estado de São Paulo é peça essencial para construir um projeto de nação alternativa. É estimulante disputar um projeto alternativo num estado em que o PT governa com 38 prefeituras, 51% do eleitorado. Evidentemente nós estamos trabalhando para realizar uma aliança com o PSB, PDT , com o PC do B , PV e com o PHS pois achamos que é muito importante construir um bloco de esquerda para derrotar o tucanato e impedir que São Paulo tenha qualquer relação com o passado malufista. Nós temos que combater o passado malufista e o presente medíocre do tucanato.

Sindiquim - Então o malufismo ainda é um risco?

Genoino - Sim, o malufismo ainda é um risco para São Paulo. Ele tem uma base social, tem uma base política, tem um discurso populista, de direita, que usa a demagogia da segurança, usa a demagogia da eficiência, das obras e nós não podemos menosprezá-lo, temos que considerá-lo como inimigo. Aqui em São Paulo temos três forças que disputam o poder em condições de igualdade: o PSDB, que é governo, o PT , e a direita representada pelo malufismo. Nós temos que levar em conta isso para termos uma carta de campanha afirmativa, uma campanha de esquerda, uma campanha muito forte, calcada na militância, apoiada nas nossas administrações, com uma forte sustentação no movimento sindical e social e ao mesmo tempo uma campanha que aglutine segmentos da sociedade paulista que nem querem a volta do malufismo nem querem a continuidade do modelo do tucanato.

Sindiquim - Como você avalia a situação do Estado hoje, após 8 anos de governo de PSDB?

Genoino - São Paulo hoje é uma síntese concentrada do Brasil. São Paulo tem peso econômico, peso político, peso social, mas ao mesmo tempo São Paulo tem hoje o maior índice de desemprego do país, o maior índice de violência e de exclusão social. Está faltando um programa e uma proposta de governo que aposte no desenvolvimento econômico e na distribuição de renda, na defesa da sociedade através de políticas públicas como a segurança, como a educação e que aposte num modelo de desenvolvimento regionalizado, um estado que regule, que fiscalize os serviços públicos como as estradas, que acabe com essa “farra” de pedágios e de tarifas caras, que possa garantir os investimentos necessários na geração de energia, fazendo parceria na área de transmissão e distribuição

Sindiquim - Exclusão, desemprego e violência: é possível combater esses problemas com uma atuação estadual?

Genoino - Acho que temos principalmente dois grandes desafios: ter um projeto de combate à exclusão social, tanto com a geração de emprego como com políticas públicas, e ao mesmo tempo ter um novo projeto de segurança pública.

São Paulo pode e tem potencialidade de voltar a crescer , voltar a produzir, voltar a desenvolver uma política industrial, uma política agrícola, voltar a ter uma atenção para os setores da agroindústria, e sempre dentro da visão de regionalizar o crescimento econômico. Precisamos apostar nas vocações de cada região, viabilizar a micro e a média empresa de maneira regional, com condições de competitividade, condições de contribuir para a inclusão gerando mais emprego.

São Paulo tem ainda suporte tecnológico, temos três universidades, temos a FAPESP e outros importantes institutos de pesquisa, e temos experiências administrativas vitoriosas: a própria vitória do PT na maioria das cidades do ABC, a experiência da Câmara Setorial do ABC, as experiências nas regiões de Ribeirão Preto, Campinas, Piracicaba e na capital. Essas experiências nos dão elementos fundamentais para governar o Estado de São Paulo alterando a lógica de um modelo de governo que só atende a quem tem dinheiro nas bolsas, quem tem dinheiro em bancos ou quem tem empresas concessionárias de serviço público.

Sindiquim – Quais as suas propostas para a Segurança Pública?

Genoino - Vamos defender um modelo de esquerda em todas as áreas para governar São Paulo, inclusive na área de segurança pública. Vamos defender uma segurança pública forte, eficiente, com as três polícias integradas: técnica, civil e militar. Temos que ter uma polícia que use a informática, o desenvolvimento tecnológico e a ciência para prevenir o crime, para investigar, e nós temos que ter uma polícia melhor paga, melhor equipada para se antecipar e prevenir o crime dentro de uma visão de defesa da sociedade e do cidadão. Claro que não vamos resolver o problema da violência social, da degradação só com polícia, mas temos que ter polícia forte e políticas sociais efetivas e universais.

Sindiquim - Que tipo de mudanças teremos na administração com a vitória de um candidato petista?

Genoino - Vamos descentralizar economicamente o Estado de São Paulo, descentralizar o orçamento, descentralizar as prioridades para ter um estado regionalizado, integrado economicamente, socialmente e politicamente. Nós vamos evidentemente defender um modelo democrático de governo, uma gestão com a participação do cidadão, com transparência , com a radicalização da democracia.

Sindiquim - Qual é a sua mensagem para os trabalhadores químicos?

Genoino - Uma mensagem de esperança e otimismo. A gente está na luta há muito tempo, com algumas derrotas, algumas vitórias, mas nunca perdemos a esperança. E principalmente agora que estamos diante de uma possibilidade de vitória, nós temos que ser muito otimistas, temos que resgatar o sonho, nos temos que resgatar o ideário de um país justo, de um país em que o povo possa viver feliz, de um país em que não haja fome e não haja tanta violência, tanta miséria e tanto desemprego. Esse sonho vai depender da mobilização, da conscientização, da participação dos trabalhadores e do povo brasileiro.

Frases:

“A corrupção no Brasil é histórica e estrutural, um setor da elite sempre se viabilizou economicamente através de um processo perverso de transferência de renda do setor público para o setor privado”

“A eleição de 2002 é um momento muito importante na história do PT, após 21 anos o futuro do PT se funde com a disputa de futuro do povo brasileiro”

“O Estado de São Paulo pode voltar a desenvolver uma política industrial, sempre dentro da visão de regionalizar o crescimento econômico”

“Temos que resgatar o sonho de um país justo, em que o povo possa viver feliz, de um país em que não haja fome e não haja tanta violência, tanta miséria e tanto desemprego”

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