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A inteligência militar

A divulgação pela imprensa de uma série de documentos sobre atividades dos serviços de informação do Exército vem causando um debate público sobre a natureza funcional desses órgãos. Produziu-se, também, uma certa apreensão pelo teor dos documentos. No essencial, eles indicam que os órgãos de inteligência do Exército vêm mantendo uma atividade de monitoramento e espionagem de movimentos sociais como o MST, CUT e ONGs e de outras entidades como a Pastoral da Terra da Igreja Católica e do próprio PT. Para exercer suas atividades, esses organismos admitem até mesmo "arranhar direitos constitucionais" das pessoas.

Além de um desvio de funções, pelo que se vê, esses serviços de inteligência, produzem relatórios sobre o óbvio e, em alguns casos, produzem inverdades perigosas como aquela em que se sugere que o MST, a CUT e o PT estariam organizando uma "brigada paramilitar". Por ser uma fantasia, o perigo está no fato de que ela pode gerar reações anômalas num sistema democrático e, até mesmo, presta-se à manipulações políticas e eleitorais. Chega a ser estranho que a Presidência da República, através do Ministério da Defesa, responsável última pela atividade desses órgãos, não exerça algum tipo de controle sobre as atividades indevidas e a qualidade daquilo que eles produzem. Neste sentido, é oportuna a audiência pública que a Câmara Federal processará no dia 5 de setembro com o ministro da Defesa, Geraldo Quintão.

Mais do que os esclarecimentos devidos, o diálogo entre parlamentares e o ministro deve servir para se produzir uma definição mais precisa sobre o papel órgãos de inteligência militar. Afinal de contas, o Estado moderno e democrático, que tem nas Forças Armadas uma de suas mais importantes instituições na defesa de sua soberania, não pode prescindir de um serviço de inteligência militar. A existência de uma inteligência eficiente, tanto a civil quanto a militar, é uma das condições importantes na garantia da defesa nacional e no processo de tomada de decisões do poder civil legítimo. O problema consiste precisamente em definir e delimitar as funções dos organismos de inteligência.

Já tivemos a oportunidade de sustentar, neste mesmo espaço, algumas idéias sobre as funções dos serviços de inteligência. Resumidamente, argumentamos que a inteligência civil (Abin) deve ser separada da inteligência militar, que deve existir um controle externo sobre a inteligência exercido pelo Congresso e que devem ser interpostas vedações sobre a atividade de inteligência preservando a liberdade de opção política, ideológica, religiosa etc.

Por ocasião da criação do Ministério da Defesa defendemos algumas funções básicas das Forças Armadas que deveriam orientar também a atividade dos órgãos de inteligência. Funções como, defesa da soberania e do território nacional, defesa externa e garantia das instituições democráticas do Estado de Direito. Sem dúvida, é necessário que o Congresso Nacional, junto com as Forças Armadas e com a sociedade civil, avance mais na definição de uma política de defesa. Mas o que se quer dizer aqui é que a atividade de inteligência dos órgãos militares deve ter como parâmetro os fundamentos funcionais das Forças Armadas. Não está definido como função das Forças Armadas controlar ou agir contra movimentos sociais, setores religiosos, ONGs ou partidos políticos. Logo, é desvio de função orientar os serviços de inteligência militar para monitorar esses movimentos e instituições políticas e civis inerentes e compatíveis com sociedades democráticas pluralistas.

Os serviços de inteligência militar deveriam concentrar suas atividades sobre a coleta e análise de informações relacionadas à defesa externa, à soberania e à garantia de funcionalidade das instituições democráticas. Na era do mundo globalizado, analisar e projetar os novos e complexos cenários internacionais, é uma necessidade imprescindível para a tomada de decisões estratégicas, tanto para as Forças Armadas, quanto para a diplomacia e os altos escalões governamentais. Deixar de produzir essas informações essenciais ao Estado para bisbilhotar movimentos sociais, além de uma atividade indevida, representa um desperdício de dinheiro público e uma privação do Estado ao acesso de informações estratégicas necessárias a um adequado processo de tomada de decisões. Na verdade, os serviços de inteligência do Exército revelam que ainda estão impregnados pelos resquícios de uma cultura antiga, que precisa ser superada, relativa ao período da Guerra Fria e da noção de "inimigo interno".

A inteligência militar não pode confundir-se com tarefas específicas da segurança pública. Ela deve produzir informações relevantes para as Forças Armadas e para o poder civil. Por isso, além de definir e delimitar suas funções, é necessário instituir um controle externo sobre esses organismos, que seria exercido por uma comissão especial do Congresso. Essa comissão estaria legal e constitucionalmente submetida à condição de guardar segredo e os documentos produzidos pela inteligência deveriam ser classificados segundo os critérios de sigilosos, secretos e ultra-secretos. De acordo com essa classificação, seriam estipulados prazos legais para que pudessem ser divulgados. Essas medidas otimizariam as condições de eficiência na definição e defesa dos nossos interesses estratégicos em consonância com as normas do Estado Democrático de Direito.

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