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As propostas do PT

A divulgação de um documento, "Um Outro Brasil é Possível", elaborado por economistas vinculados ao PT, abriu a discussão pública sobre as propostas para o programa de governo da candidatura petista para a Presidência da República. O debate é oportuno, mas é preciso notar que o documento é ainda uma primeira versão do trabalho dos economistas e não se trata de uma posição oficial do partido, já que não foi aprovado em nenhuma instância partidária. O documento deve ser encarado também como um aspecto da elaboração do programa. Um programa de governo não deve se reduzir a um enfoque econômico e não pode ser obra só de economistas.

A rigor, um programa de governo deve definir as diretrizes e os objetivos da ação governamental para o país de um partido e de um candidato, a partir de uma base de realidade e de um período limitado no tempo. Mas um programa de governo não pode limitar-se apenas a um conjunto de propostas e soluções técnicas. Ele precisa incorporar uma dimensão de transcendência do statu quo, levando em conta aquela noção weberiana de que jamais se alcançaria o possível se não se tivesse almejado o impossível. Por isso, um programa de governo deve tangenciar também um projeto para o País.

Assim, o programa de governo deve definir-se sobre três grandes eixos estruturantes, interdependentes entre si: uma concepção acerca do Estado, uma concepção acerca da sociedade e uma concepção acerca da economia. Evidentemente, esses eixos têm uma interface interna e outra externa, principalmente se considerarmos o grau de internacionalização da economia.

Formular um programa de governo a partir de uma posição de esquerda democrática e pluralista oferece, hoje, um elevado grau de dificuldade pelas seguintes razões: 1) o Estado-Nação está passando por um profundo processo de mudanças, com perda de funções tradicionais de governabilidade e necessidade de redefinição de novas funções; 2) além de ser necessário levar em conta os condicionamentos das reformas neoliberais, da globalização e das novas tecnologias sobre a economia, é preciso ter presente que as mudanças sofridas pelo Estado nacional limitaram a abrangência de sua ação nesta esfera; e 3) os múltiplos processos de mudança estão produzindo impactos complexos sobre a sociedade, desestruturando comunidades e formas de produção econômica, gerando insegurança e desemprego, induzindo a perdas de identidades e transformando os padrões culturais, psicológicos e morais das pessoas. Na esfera da sociedade e das políticas públicas, o Estado vem perdendo capacidade de intervenção, fato que exige também nisso a redefinição de suas funções.

O pouco que se pode dizer aqui é que o Estado democrático precisa exercer um conjunto abrangente de papéis e funções indelegáveis de governabilidade. Não pode abrir mão de ser a fonte legítima da norma e de ser a garantia jurídica e material da liberdade, dos direitos dos cidadãos, da justiça, da eqüidade social, da ordem pública e de mediar os conflitos sociais, buscando soluções que visem ao equilíbrio e ao bem-estar da sociedade. Se o Estado perdeu a condição de ser o gerente da economia e da sociedade e os instrumentos e autarquias de intervenção econômica, deve, contudo, apropriar-se de uma forte função de regulação, indução, planejamento e mediação de situações, processos e conflitos. Para evitar os efeitos perversos das mudanças, da tecnologia, da globalização e da mobilidade do capital, deve definir um papel ativo no estabelecimento de contrapartidas sociais ao capital e buscar uma nova regulamentação das relações de trabalho. E, numa economia internacionalizada, o Estado passa a cumprir um papel decisivo na articulação e definição de interesses e no apoio à inserção dos setores dinâmicos da produção no contexto dos mercados globais.

Numa economia de mercado, um programa de esquerda deve ter no desenvolvimento econômico com distribuição de renda e eqüidade social seu eixo orientador. Claro que esta diretriz sofre uma série de condicionamentos, como o da dívida pública, da dependência externa e da necessidade de se estabelecer metas inflacionárias. Mas essa diretriz é o valor principal do programa, as outras variáveis, que precisam ser consideradas e tratadas de forma responsável, devem ser-lhe subordinadas. Ou seja, um programa de esquerda, para não descaracterizar-se, deve definir prioridades, amarrando um conjunto de variáveis e metas econômicas e sociais coerentes e viáveis, mesmo que limitadas. Respeitar contratos é uma condição de confiança, mas, no caso da dívida pública, é possível negociar prazos e custos. Governar, enfim, é estabelecer direção e sentido e os meios que os operacionalizem.

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