1982-2002

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Censo e distribuição de renda

Os dados preliminares do Censo 2000, divulgados pelo IBGE, indicam uma perspectiva geral de evolução do Brasil que pode ser classificada como positiva. O grande senão continua sendo a péssima distribuição de renda.A perspectiva positiva sustenta-se sobre dois vetores: a melhoria de alguns indicadores sociais e a pluralização de valores. Isso não significa, no entanto, que mesmo onde ocorreram avanços não tenham persistido enormes obstáculos a ser superados. Dados se prestam a muitas leituras e interpretações, tanto otimistas quanto pessimistas. A interpretação que propomos é a de que, se a realidade se mostra muito aquém do possível e do desejado, a perspectiva é animadora. Pode-se afirmar que o Brasil está preparado para dar um salto de qualidade para ingressar num novo patamar de desenvolvimento e bem-estar. Mas para isso precisa mudar de rumo em relação ao modelo que foi adotado na última década.

Tome-se o caso da educação como exemplo. O censo indica que a escolarização aumentou em todas as faixas etárias e em todos os níveis, da pré-escola ao ensino superior. Das crianças que têm entre 7 e 14 anos, 94,9% estão na escola. É exatamente este número que constitui a base para uma perspectiva positiva. Claro que por si só ele não se basta. Mas, se esta tendência for mantida, se a educação sofrer um salto de qualidade e se os números da educação superior sofrerem um salto de quantidade, em uma ou, no máximo, duas gerações a fisionomia da qualificação humana no Brasil terá mudado.

Esta é uma condição necessária para que os níveis de desenvolvimento e bem-estar agreguem um empuxo positivo, para o alto. Outro dado animador é que a taxa de mortalidade infantil vem caindo, situando-se na faixa de 30 crianças mortas com menos de 1 ano de idade por mil nascidas vivas.

Essa perspetiva positiva e os desafios que ela comporta não podem obscurecer os aspectos negativos que precisam ser superados. Mesmo na educação ou na assistência à criança, o censo mostra que nove em cada dez crianças de 0 a 3 anos não freqüentam creches, que 31,4% da população com mais de 10 anos pode ser considerada analfabeta ou analfabeta funcional e que 59,9% da população com mais de 10 anos não conseguiu concluir o ensino fundamental.

No vetor dos valores, pode-se destacar como perspectiva positiva que o Brasil se esteja assumindo mais como um país pluralista em termos religiosos, étnicos e culturais. A consciência das diferenças e das identidades específicas e o convívio entre elas apontam para o fortalecimento do multiculturalismo e para a tolerância religiosa e étnica, valores que faltam em muitas outras partes do mundo. A queda de fecundidade é um indicador de que o valor do planejamento familiar veio para ficar.

O grande problema e, conseqüentemente, o grande desafio do Brasil é a distribuição de renda. Os dados revelam que nos últimos dez anos praticamente nada foi mudado nesse trágico item, que faz o Brasil situar-se entre os cinco países mais desiguais do mundo. Os 10% mais pobres ficam com apenas 1% da renda produzida. Já os 10% mais ricos ficam com 45,7%. Ou, ainda, os 50% mais pobres ficam com apenas 14,5% da renda. Metade dos brasileiros ganham só dois salários mínimos. No Nordeste a situação é ainda mais grave: 73% das pessoas com rendimento ou ocupadas ganham até dois salários mínimos. Nessa mesma região, apenas 4% da população ocupada ganha mais de R$ 1.510.

O caráter insolúvel da concentração de renda no Brasil, nos últimos dez anos, revela a natureza do modelo econômico que foi adotado e a necessidade de mudá-lo. As causas da concentração de renda são conhecidas. Faltou vontade e prioridade políticas para removê-las. Veja-se o caso do modelo tributário. Como é sabido, em nosso país o consumo e o trabalho pagam mais tributos que o capital. O capital, em contrapartida, é mais subsidiado do que o trabalho. Portanto, além de um modelo tributário concentrador de renda, há um deslocamento de recursos dos pobres para os ricos por conta das prioridades, do modelo e das decisões governamentais. No caso do Imposto de Renda, a existência de apenas duas faixas de tributação e a forma como elas incidem sobre as níveis salariais fazem com que os estratos dos assalariados e da classe média sejam os mais gravados. Nos países desenvolvidos existe maior número de faixas de tributação e com porcentagens mais altas para os rendimentos mais elevados. Esses modelos tributários diminuem as diferenças salariais e têm um caráter distributivo.

Nos últimos dez anos, as camadas pobres da população brasileira enfrentaram dificuldades de acesso a recursos para a saúde, educação e moradia. Além da precariedade dos direitos de propriedade, essas camadas praticamente não têm acesso ao crédito, fator que despotencializa suas oportunidades econômicas.

O sistema de crédito existente, além de limitado, é proibitivo. Quando é obtido, torna-se extorsivo.

Outro fator que inibiu a distribuição de renda foi o pífio crescimento econômico que o Brasil experimentou na última década. Além de não ser suficiente para atender às novas demandas por trabalho, o modelo adotado jogou ao desemprego milhões de brasileiros. O alto grau de dependência externa, em termos financeiros e tecnológicos, fez o Brasil exportar empregos. Diminuir esse grau de dependência, reformar o sistema tributário, induzir políticas de desenvolvimento e investir em políticas sociais constituem alguns dos fundamentos que um novo modelo precisa adotar para que o Brasil possa desenvolver-se de forma mais justa.

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