1982-2002

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Energia - o golpe no consumidor

A aprovação da Medida Provisória 14/01, que transfere para o consumidor supostos prejuízos que as empresas do setor elétrico tiveram com o apagão e institui o "seguro antiapagão", constitui um golpe contra os consumidores, porque ela é ilegal e imoral. Ilegal porque a legislação vigente determinava que os riscos da prestação de serviços de energia eram por conta dos concessionários. Imoral porque toda a sociedade e os demais agentes econômicos foram prejudicados com o racionamento, mas somente o setor elétrico obteve ajuda do governo, o que constitui um privilégio. O mais grave é que o setor elétrico deveria ser punido por ter descumprido os contratos ao não fornecer o serviço de forma adequada, com continuidade, qualidade e modicidade tarifária, como determina a legislação.

O governo, com a ajuda do PSDB, PFL, PMDB, PPB e PTB, inverteu a ordem das coisas: em vez de punir os responsáveis pelo racionamento e pela violação da legislação, decidiu punir os consumidores, vítimas da crise de energia. Na verdade, quem deveria ser indenizado era o consumidor. Nos outros países em que ocorreram racionamentos, as concessionárias foram punidas por violação de contratos. Além dos prejuízos com o racionamento, o consumidor é obrigado a pagar os empréstimos que o governo, por intermédio do BNDES, fez às geradoras e distribuidoras de energia. Empréstimo que chega à ordem de R$ 7,3 bilhões.

As concessionárias de energia, como foi amplamente divulgado pela imprensa, obtiveram um aumento de rentabilidade em de 2001, ano do apagão, em relação a 2000. Por conta da crise de energia, essas empresas, como todos os outros setores da economia, tiveram receitas não realizadas. Inescrupulosamente, o governo, atendendo a pressões dessas empresas e das embaixadas de seus países de origem, transformou receitas não realizadas em prejuízo. Aumentou as tarifas, concedeu o empréstimo via BNDES e mandou a conta para os consumidores. Se havia um conflito entre as geradoras e as distribuidoras por conta do racionamento, o bom senso determinava que ele fosse negociado ou decidido na Justiça. O governo, no entanto, antecipou-se ao conflito, protegendo o setor elétrico com mais uma medida de capitalismo sem risco e de neopatrimonialismo, dentre tantas outras que vem caracterizando a era do tucanato.

A MP 14/01, ao instituir o "seguro antiapagão", estabelece novo golpe no bolso do consumidor. Este "seguro" é cobrado do consumidor a título de "encargo de capacidade emergencial". O encargo está sendo cobrado de 1.º de março de 2002 até 31 de dezembro de 2005. As compras já contratadas agregam o valor de R$ 16 bilhões, gastos para estocar energia emergencial a uma capacidade de 2.153 MW. Falsificando o conceito de seguro, o governo está instituindo um novo tributo por medida provisória, algo inconstitucional.

Seguro significa um contrato pelo qual a parte contratada se obriga, mediante cobrança de prêmio, a indenizar a outra na enventualidade de prejuízo. O "seguro antiapagão" nada mais é que uma transferência para as tarifas pagas pelo consumidor do ônus pela contratação de energia emergencial. E, em caso de novo racionamento, a medida provisória nem sequer estipula as indenizações a serem pagas aos consumidores, elemento essencial de qualquer seguro. O que o governo faz é divulgação enganosa para encobrir a cobrança de um tributo ilegal.

Pelo contrato de concessão, que determina a prestação de serviço público por conta e risco das concessionárias, caberia a elas contratar energia emergencial, já que as tarifas que o consumidor paga incluem a remuneração pela qualidade, continuidade e confiabilidade dos serviços. Os termos de contratação de energia emergencial contêm cláusula de confidencialidade, opção pela arbitragem, em vez do sistema judiciário, para solução de controvérsias e reajustes atrelados ao dólar. Essa falta de transparência fundamenta suspeitas de irregularidades e improbidades. A contratação foi realizada sem licitação e a preços quatro a cinco vezes superiores aos que são praticados no mercado.

A sociedade assiste, estupefata, a um "acerto" monopolista entre empresas geradoras, fornecedoras, Câmara de Gestão da Crise de Energia e BNDES, com o objetivo de isentar as empresas e o governo das responsabilidades morais e materiais pelo racionamento. Além dessa fuga da responsabilidade, o "acerto" joga nos ombros do consumidor e sobre os outros setores produtivos (pessoa jurídica) uma sobretaxação de 2,9% e 7,9%, respectivamente. As privatizações, que no discurso do governo deveriam desonerar o Estado dos prejuízos na prestação de serviços e estabelecer a competitividade no setor de energia, transformaram o Estado num grande protetor de concessionários. O Estado, além de não regular e de não fiscalizar, distribui empréstimos subsidiados, estabelece isenções tributárias para as concessionárias e manda a conta para os contribuintes e consumidores. Depois do racionamento suscitado pelo apagão mental dos responsáveis por esse serviço, que não planejaram e não investiram, estamos agora assistindo a seu apagão moral.

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