1982-2002

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O alerta das pesquisas

O presidente Fernando Henrique Cardoso assumiu o governo com imenso apoio da opinião pública conferido pelo êxito do Plano Real. Sua popularidade estendeu-se para um período anormal em se tratando de governantes brasileiros, pois a maior parte deles caem em desgraça nos primeiros meses de governo. As últimas pesquisas dos institutos de opinião, no entanto, indicam que o beneplácito da população com o governo começa a perder força.

As razões do desgaste do governo são várias. Julgo que uma das principais refere-se ao fato de que a expectativa da população vai muito além da mera estabilização econômica. A pesquisa do Vox Popoli aponta a reprovação do governo em políticas bem concretas como a reforma agrária, saúde, educação, habitação, previdência/aposentadoria, desemprego etc.. A população percebe que a presença da ação do governo nas várias áreas de governabilidade é frágil. A rigor, o governo, até agora, bateu em duas teclas: a estabilidade econômica e as reformas. Quanto ao primeiro ponto há apenas um gerenciamento, sem muitas inovações, de uma situação herdada da administração anterior, com méritos inegáveis a Fernando Henrique e sua equipe econômica. Mas, no momento em que o País é assolado por uma onda de desemprego e inadimplência a sociedade espera mais do governo no terreno econômico. A população espera que a estabilidade econômica se traduza em benefícios, em desempate em relação ao período inflacionário. O fato é que os trabalhadores e a classe média vivem numa situação de aperto salarial muito grande. A agricultura pagou um alto preço pela estabilização e o salário mínimo não teve o incremento prometido por Fernando Henrique na época da campanha eleitoral.

Quanto às reformas constitucionais, o governo custa a perceber que elas não são um ato de governo propriamente dito e que elas terão efeito apenas a médio prazo. A população não sente um efeito imediato das reformas. As pesquisas captam também o principal motivo do descontentamento: a inação do governo nas políticas sociais. Nenhum governo terá êxito perdurável enquanto a enorme dívida social não for resgatada. Não é por acaso que os prefeitos e governadores que apresentam altos índices de aprovação, no geral, são os que mais investem em políticas sociais.

Acredito que outro motivo do desgaste do governo está na sensação de paralisia das instituições estatais, nos órgãos governamentais e na administração pública. Da Saúde à reforma agrária, da educação aos transportes, da fiscalização à política de emprego, parece que a máquina do Estado não age. Parece que o governo não tem programa para estas questões. Na área da habitação houve a destinação de pequenas parcelas de recursos para financiamento de moradia para trabalhadores de baixa renda, mas os demais trabalhadores e a classe média estão sem alternativas há anos. Estes setores, que enfrentam o sufoco dos aluguéis altos que consumem mais de 30% do valor dos salários, estão a espera de promessas não cumpridas do governo. Esta situação se repete na saúde, na educação etc.

A sucessão de tragédias, como a de Caruaru e de chacinas como a dos sem-terra no sul do Pará, e a ação pouco eficaz do governo para fazer frente a este tipo de problema também foi outro fator que acumulou desgastes. Fica estranho aos olhos da opinião pública a promessa de punições, de aceleração da reforma agrária e ao mesmo tempo a incapacidade do governo de fazer com que sua base no Congresso apóie medidas que tornem as promessas realidade. A sociedade pensa que o governo a está enganando.

Talvez mais do que qualquer outra coisa, o que vem reforçando o descontentamento popular é o socorro incondicional que o governo presta a bancos públicos e privados quebrados, a municípios e estados endividados, a estatais no vermelho, a ruralistas inadimplentes etc.. O contribuinte fica com a sensação de que há dinheiro para tudo, menos para as necessidades básicas da população. O governo não conseguiu explicar satisfatoriamente a maior parte destas medidas de socorro, que segundo informações de jornais atingem o montante de mais de R$ 50 bilhões. Em paralelo a isto, há as concessões que o governo vem fazendo à sua base de sustentação no Congresso. Além dos aspectos éticos, o governo reforça a imagem de que é fraco e prisioneiro de uma base parlamentar voraz, que não tem limites e escrúpulos para exigir o que quer.

As pesquisas são um sinal de alerta. O pior erro que o governo pode cometer é desconsiderá-las ou achar que refletem apenas um momento conjuntural. Se o governo não reverter as expectativas com ações e não com publicidade, o desgaste tende a se aprofundar. Mas para mudar as expectativas com ações o governo enfrenta enorme dificuldade por encontrar-se preso a uma base conservadora. De qualquer forma, cabe ao governo e não a nós da oposição, decidir sobre qual a perspectiva política que esta administração adotará

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