1982-2002

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Artigos


A crise do Congresso

Talvez poucos articulistas e observadores políticos tenham se dado conta, mas o fato é que o Congresso vive uma crise de credibilidade. O descrédito da instituição junto à opinião pública, captado pelas pesquisas, é um sintoma de que algo está errado no seu funcionamento. O mais grave de tudo é que a crise de legitimidade começa a se alagar sobre outras instituições. O caso do Banco Central é notório: a sua omissão e a sua conivência com as fraudes dos bancos estão provocando indignação e descrença na população. O cidadão comum começa perceber que quando as instituições democráticas são submetidas a provas de fogo, falham. O próprio impacto da novidade do governo Fernando Henrique começa a se dissipar e muitos já percebem que, no que se refere ao funcionamento das instituições do Estado e à prestação de serviços públicos, nada mudou. As reformas, até agora, também não conseguiram produzir melhorias perceptíveis.

A crise do Congresso está relacionada com a perda de capacidade de iniciativa. Neste particular, o processo das reformas é ilustrativo: os partidos e as lideranças parlamentares governistas abrigaram-se no largo guarda-chuva do governo e ficaram a reboque de suas propostas. Nós, da oposição, fomos incapazes de gerar alternativas a partir da nossa atuação parlamentar. Com esta situação, a opinião pública passou a ver o Congresso ou como um órgão meramente homologatório ou como um estorvo. A omissão chegou a tal ponto que na reforma da Previdência, o Congresso foi praticamente marginalizado nas negociações entre governo e centrais sindicais. A crise, na verdade, expressa a deterioração dos partidos políticos que, fragmentados e divididos, não conseguem formular projetos e estratégias para o país.

A perda da capacidade de iniciativa do Congresso se reflete também em outros pontos que atingem diretamente a sociedade. O episódio recente da assinatura do contrato de trabalho temporário entre o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e algumas empresas, ao arrepio da lei, revela que o Congresso perdeu a capacidade de acompanhar, no âmbito legislativo, as necessidades de mudanças sociais. Com isso, abre-se caminho para que soluções equivocadas, que aprofundam o barbarismo social, se imponham por conta das contingências. A inoperância da fiscalização do Banco Central sobre os bancos também traz reflexos negativos ao Congresso. Se a atual estrutura do BC se mostra anacrônica e ineficaz, cabe ao Congresso atualizá-la, reformulando seus mecanismos de fiscalização e exercendo uma vigilância mais severa sobre o seu funcionamento. A necessidade de um Banco Central independente já está por demais evidenciada, mas o Congresso mostra-se incapaz de instituí-lo.

Grande parte das instituições e das funções do Estado, que precisam ser reformuladas para atender os seus objetivos públicos, não estão sendo atingidas pelo atual processo de reformas. Em última instância, é tarefa do Congresso redefinir o papel do Estado, promovendo uma limpeza no anacronismo e nos privilégios. Mas a questão de fundo é que a condição sine qua non para que isto ocorra é a realização de uma reforma profunda no próprio Congresso. Vícios arraigados, interesses corporativos e privilégios instituídos impedem a efetivação dessa autoreforma.

O caso do Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC) é emblemático nesse sentido. A discussão em torno da manutenção ou da extinção da privilegiada aposentadoria especial dos parlamentares sobrepôs-se ao debate e à busca de soluções de outras questões mais relevantes para a sociedade. Com isto, o Congresso fica paralisado diante da incapacidade de solucionar os seus próprios impasses. Se a crise do IPC não for resolvida com um corte radical de todos os privilégios instituídos da corporação política, não só do Legislativo mas também do Judiciário e do Executivo, a crise de legitimidade das instituições democráticas tende a se agravar.

Privilégios instituídos e incapacidade operante do Estado, somados a uma crise social violenta, com o esgarçamento das relações e o reforço do individualismo selvagem, proporcionam espaços para que se especule sobre a adoção de medidas de força para a solução dos problemas. É impressionante como o presidente do Peru, Alberto Fujimori, trafegou livremente pelo país pregando medidas corretivas ao Legislativo e ao Judiciário. Chegou a arrancar elogios de empresários paulistas, provavelmente os mesmos que se servem do Estado para realizar os seus interesses particulares e se tornam anti-estatistas quando se trata de buscar soluções para os interesses da população. Diga-se de passagem que o neoconservadorismo político, anda, em vários países, embalando sonhos de um Executivo forte com prerrogativas semiditatoriais, a exemplo das que permitiram a reeleição de Fujimori. Para barrar este caminho, a democracia tem que se fazer eficaz na solução dos problemas e o Congresso e as demais instituições democráticas têm que parar de serem usinas alimentadoras do descrédito do sistema democrático.

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