1982-2002

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Guerra santa e tolerância

O fim da Guerra Fria e a desvalorização do conflito ideológioco parece que estão abrindo espaço para outras formas de intolerância neste final de século. Alguns téricos chegam a projetar que o século XXI será recortado por conflitos civilizacionais. Estrategistas ocidentais vêem no islamismo o novo "grande mal" que ameaça os fundamentos da civilização greco-romana-cristã. A exacerbação dos conflitos étnicos é outra manfestação de intolerância, de desoreintação em relação a valores univerais e de anomia. O desespero social, o individualismo anti-social, a perda de sentido da vida em sociedade política etc., são ingredientes que alimentam o conservadorismo e todas as formas de fanatismo. Nesse final de século, as pessoas parecem estar mais dispostas a se refugiarem no seu gueto a buscar alternativas de reconstrução de uma comunidade polítca democrática. A chamada "guerra santa", envolvendo a Igreja Universal do Reino de Deus e a Igreja Católica está carregada por esses condicionamentos que marcam o presente.

Aparentemente, o conflito entre as duas igrejas não teria razão de ser. Ambas são herdeiras da mesma origem e comungam os mesmos valores religiosos e civilizacionais. Mas, há séculos, foi-se o ecumenismo dos primeiros cristãos. Todo o cristianismo intitucionalizado em igreja, a exemplo de qualquer outra religião, repudia o ecumenismo na medida em que prega a sua crença como a única verdadeira. Por princípio, a religão institucionalizada, ao absolutizar a sua "verdade" como a verdade, detrata um dos direitos fundamentais da pessoa humana que é o da liberdade de convição. Se as igrejas se toleram umas às outras é graças à imposição do Estado.

No Brasil sempre houve uma ligação entre Estado e igreja. A igreja ocupou e ocupa espaços, influencia decisões de governo a partir da ótica religiosa, estabelece vínculos valorativos com as normas institucionais e pressiona pela vigência do ensino religioso nas escolas. A própria constitucionalização do nome de Deus expressa a intervenção da igreja nos assuntos de Estado. Mais recentemente, várias igrejas se lançaram numa renhida disputa pelo controle dos meios de comunicação. Rádios e TVs são instrumentos poderosos de influência e de poder político. A partir deles, as igrejas não interferem apenas nos assuntos de fé, mas articulam interesses políticos em favor de grupos, partidos e candidatos. Num Estado laico, defensor do princípio do pluralismo religioso, como deve ser o Estado democrático, essa ingerência das igrejas nos assuntos políticos é algo inaceitável e perigoso. Corre-se o risco da politização das disputas regiligiosas.

Quando as igrejas se lançam na disputa de poder, fere-se a religisidade dos indivíduos, pois esta se fundamenta na experiência intuitiva da fé e a disputa pelo poder desloca o respeito ao pluralismo em nome do autocentrismo. A intromissão de uma igreja na disputa de poder não representa apenas um desrespeito a outras religiões, mas também aos indivílduos que não professam nenhuma religião. A agressão a símbolos religiosos também agride o direito humano da liberdade religiosa e estimula o sectarismo, a intolerância e o absolutismo da crença. A reinteração dessa prática agressiva, seja por palavras ou atos, principalmente quando assume dimensões de massa, pode estimualar o estravasamento de outros instintos agressivos da população.

Diante da potencialização da intolerância religiosa, o poder político, particularmente o legislativo, deve monitorar esse conflito e, se necessário, instituir nova legislação mais rígida para coibir as manifestações de intolerânica. Acredito que é preciso também reexaminar a relação das ingrejas com os meios de comunicação e a instrumentalização política que fazem de rádios e TVs. Quanto às igrejas, espera-se que sejam tolerantes umas com as outras e que respeitem a liberdade de consciência dos indivíduuos não apenas porque os preceitos legais assim exigem. A tolerância vincula-se ao respeito ao direito que cada um tem de professar a sua própria verdade e a sua liberdade de covicções. Como bem ensina Norberto Bobbio, a tolerância é um método universal de "convivência civil" e, acrescente-se, religiosa. Só ela permite a recusa consciente à violência, a instaração da confiança na razão, caminho pelo qual as idéias podem triunfar pela luz iluminadora do diálogo. Se há uma verdade, ao monos no âmbito social e político, ela é uma verdade compartilhada a partir de opinões diversas. A intolerância verbal e física manifesta a impotência de argumentos e uma falta de confianças nas próprias crenças de quem recorre a esses métodos para fazer valer suas opiniões.

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