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Todos os momentos significativos nas histórias dos povos, sejam eles positivos ou negativos, deveriam servir para firmar determinadas lições, para sedimentar determinados avanços na cultura, nas práticas e nos costumes políticos e para aperfeiçoar as instituições. Infelizmente, nem sempre é assim. Os fatos recentes das CPIs do caso PC-Collor e do Orçamento não produziram o impacto necessário capaz de evitar o escândalo dos precatórios. Cidadãos de estados e municípios passam pelo constrangimento e pela frustração de verem os seus governantes envolvidos em novas falcatruas.
O caso de São Paulo merece atenção especial. Não se trata apenas de exigir a punição dos culpados, inclusive com a perda de mandatos e futuras elegibilidades. O caso é exemplar porque fornece elementos de estudo de certos comportamentos políticos. O governo Pitta mal começou e está totalmente paralisado. Se o seu titular permanecer no cargo será marcado até o fim por suspeições de natureza moral e não terá força para viabilizar determinados projetos. Será prisioneiro dos vereadores e de interesses que lhe salvaram a pele frente a ameaça de uma CPI municipal. Quem perde com isso é a população e a cidade como um todo. Pesquisas veiculadas pela imprensa indicam que não só a maioria dos paulistanos acredita no envolvimento de Pitta e Maluf, mas que mais de 60% do eleitorado do prefeito acredita na sua culpabilidade. Um governante sem credibilidade representa uma condição de ingovernabilidade.
Esta situação desagradável leva a três tipos de reflexões. Primeiro, políticos e candidatos com históricos públicos honestos não conseguiram se viabilizar enquanto alternativas na campanha municipal. Isto mostra que o candidato-mercadoria, o candidato-marketing, tende a ganhar terreno nas disputas eleitorais sobre candidatos que centram sua propaganda e programa em assuntos mais reais da sociedade.
Segundo, a maioria do eleitorado, mesmo informada das suspeitas que pesavam sobre Pitta, preferiu sufragá-lo. Normalmente os políticos são cobrados pelos eleitores. Agora chegou a vez de cobrar uma atitude mais consciente do eleitorado. Os políticos, mal ou bem, cumpriram seu dever com as CPIs. Chamaram a atenção sobre determinadas práticas inconvenientes. Mesmo assim, o eleitorado se deixa levar pelo invólucro que determinados políticos apresentam, como aconteceu com Collor e, muito provavelmente, com Pitta. "Passar o Brasil a limpo" é uma atitude que depende também do eleitorado.
Em terceiro lugar, é preciso refletir sobre o papel da imprensa. Não há dúvidas de que a imprensa cumpriu um papel decisivo no impeachment de Collor. Mas ela parece ainda tímida em publicizar a vida pública dos candidatos durante as campanhas eleitorais. Não se trata de vasculhar picuinhas privadas, mas de expor ao eleitorado os fatos, os atos e os comportamentos dos candidatos em suas funções públicas ou partidárias. A atitude do Jornal da Tarde, inclusive, foi mal compreendida por boa parte do eleitorado e da própria imprensa quando, na última campanha, indicou que Pitta poderia ter desfalcado o município através de atos administrativos. A imprensa tem enorme credibilidade. Por isso, sua responsabilidade não deve ser menor. Se ela cumpre uma função preponderante na formação e informação da opinião pública tem o dever de informar o eleitor, sem partidarismo, sobre as qualidades e os defeitos políticos dos candidatos.
Outra questão merece, ainda, ser objeto de reflexão. Pitta, a exemplo do ex-governador Fleury, foi um candidato sem tradição política, seja na direção de partido político seja em cargos eletivos. Nas democracias consolidadas dificilmente uma pessoa nessas condições, mesmo que tenha sido um burocrata eficiente, chega a se alçar candidato a cargos tão importantes. O próprio partido impediria essa possibilidade. Aqui, na verdade, líderes caudilhescos impõem candidatos como prepostos seus. Candidatos sem tradição, sem dominar a arte do jogo político, e que são apresentados como novidades mágicas para os eleitores. A boa política democrática recomenda que os candidatos a cargos importantes sejam pessoas experimentadas na vida política, conhecidas da opinião pública.
A fragilidade dos partidos no Brasil é uma das armas que os políticos espertalhões usam para enganar o povo. A história eleitoral das democracias mostra que, de fato, o povo, as vezes, se deixa enganar. Mas não menos vezes mostra, também, que o povo sabe aprender com os seus desacertos. Espera-se que aprenda desta vez. A corrupção, além de ser reprovável moralmente, é exemplo de ineficácia governamental. Representa o desperdício de bens públicos em favor de setores privados.