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Os episódios de práticas de torturas, extorsões e assassinatos praticados por policiais militares e mostrados pela TV começam a mostrar o Brasil verdadeiro que estava escondido sob o falso brilho do Brasil Real. Não é que a economia não tenha melhorado, isto é inegável. Mas a sociedade não melhorou. É sintomático que os estados que apresentam maiores incidências de casos graves de violência policial, São Paulo, Rio de Janeiro e Pará, sejam governados por políticos do PSDB, partido do presidente Fernando Henrique. Nunca é demais lembrar o massacre que a política do Pará perpetrou contra os sem-terra.
As cenas da TV assemelham cada vez mais o Brasil, ao menos na área social e policial, a países centro-americanos ou africanos nos tempos de ditadoras sanguinárias. As cenas da polícia invadindo favelas, dando tiro para todos os lados, massacrando sem terra etc expressam um estado de repressão brutal, inconcebível num país democrático, cujos governantes se gabam pelo seu sangue azul modernizador. Não é só a violência policial que deixa a opinião pública estarrecida. Convém lembrar que o Estado financiava clínicas que matavam pessoas, que o cidadão comum paga imposto de renda mas que os milionários banqueiros Fábio Nahoun e Ronaldo Ganon, donos do banco Vetor, o mesmo do escândalo dos precatórios, receberam restituição do IR nos últimos anos. No caso dos precatórios, políticos desviaram milhões de reais, pagos pelos cidadãos, e nada vai acontecer. O que dizer das informações da imprensa de que, Paulo Maluf, um dos suspeitos no caso dos precatórios, teria recebido telefonemas do presidente do Congresso sinalizando que ele não seria atingido pela CPI? E do governo, que não quer que os grandes bancos sejam investigados?
O que está claro é que, no Brasil, a famosa inversão da passagem da monarquia para a democracia não ocorreu. Aqui o Estado não é encarado do ponto de vista dos interesses e direitos dos cidadãos, mas dos governantes e de parte das elites, geralmente, financiadoras de campanhas eleitorais. Para os pobres, negros e trabalhadores, a lei, o dever, os impostos. Para as elites, a permissividade e a impunidade. Na essência, o Estado brasileiro, age contra os cidadãos. Vivemos numa sociedade sem direitos, principalmente quando se trata dos setores mais pobres.
As ações criminosas dos policiais militares são injustificáveis. Mas seria demagógico atribuir todas as responsabilidades à corporação da PM. Existe uma escala de ações e omissões criminosas que atingem os governos estaduais e o Congresso. Os vários episódios de violência que vêm se sucedendo provam que os governadores só agem quando explodem a violência e os massacres. Ora, se qualquer jornalista é capaz de descobrir casos de violência é inverossímil que um governador, que conta com sistemas de segurança e informação, não possa saber o que se passa entre seus comandados. É escandaloso, por exemplo, que o jornalista Amaury Júnior se desloque de São Paulo para Manaus e descubra a prostituição infantil sob o nariz do governador, da polícia e do judiciário do Amazonas. O que vem ocorrendo nas áreas sociais, de segurança e fiscalização no Brasil não se trata mais apenas de omissão. Trata-se da conivência das autoridades. Os cidadãos deveriam lutar para que essas omissões e conivências devessem constar no rol dos crimes de responsabilidade.
Nós, legisladores, também não podemos escapar da responsabilização do que vem ocorrendo nessas áreas. Afinal de contas, somos nós os responsáveis pela dotação do país por leis e instituições eficazes. Na área de segurança, por exemplo, existem excelentes projetos tramitando no Congresso visando mudanças e melhorias. O projeto do deputado Hélio Bicudo, que prevê o julgamento dos crimes de militares pela justiça comum, foi desfigurado pelo Senado. Ali, a omissão passou para uma ação deliberada em favor da impunidade e contra a cidadania. As medidas que podem melhorar a área da segurança, em resumo, são as seguintes: 1) Criação de uma polícia única, com comando único, profissionalizada com salários dignos, desmilitarizada, preventiva e investigativa, com critérios rígidos de recrutamento e aparelhada tecnicamente para garantir a segurança e defender os cidadãos; e, 2) fim da Justiça Militar dos estados, que favorece a impunidade e impede julgamentos isentos. Estas e outras mudanças exigem responsabilidade dos congressistas e vontade política dos governadores.
Quero enfatizar mais uma vez que os Direitos Humanos e os direitos concretos dos cidadãos são inseparáveis. É positivo que governo federal crie órgãos de DH, mas deve agir para garantir os direitos concretos dos cidadãos. Por outro lado, os Direitos Humanos não estão em contradição com o combate eficaz da criminalidade. Pelo contrário, é a impunidade, principalmente a impunidade das autoridades e das elites, que favorece a violação dos Direitos Humanos.