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Discurso em homenagem à Giovanni Falcone

Discurso pronunciado pelo Deputado José Genoino no Pequeno Expediente
da sessão da Câmara dos Deputados do dia 22 de maio de 1997.

Senhora e Senhores Deputados:

Amanhã, 23 de maio, fazem cinco anos que o insigne magistrado italiano, Giovanni Falcone, foi barbaramente assassinado na Sicília, Itália. A explosão de uma tonelada de dinamite, colocada debaixo do guar-rail da estrada siciliana que liga a cidade de Capaci à capital provincial de Palermo, tirou-lhe a vida. Com ele também foram mortos sua esposa e magistrada, Francesca Morvillo, e cinco homens da escolta que o acompanhava. O atentado foi planejado e executado pela cúpula da Cosa Nostra na Sicília, na época comandada pelo mafioso Salvatore Riina (Totó Riina).

Como muito bem lembrou sua irmã, Maria Falcone, Presidenta da Fundação Giovanni e Francesca Falcone, sediada em Palermo e criada após o atentado com o intuito de perpetuar e divulgar as concepções, os ideais e as formas de luta contra o crime organizado preconizadas pelo juiz Giovanni Falcone, "a interpretação sobre a tragédia de quem, como Giovanni Falcone, sacrificou a própria vida na guerra contra a criminalidade organizada, passa a ser positiva e construtiva. Ele e outros homens empenhados nesta guerra não lutaram em vão. O empenho inicial desse homem obrigou as instituições e a própria sociedade a encararem, de modo direto, a realidade do fenômeno da criminalidade mafiosa, que é desestabilizante e por muito tempo foi subestimada. Além disso, tal empenho provocou firme reação em linha de contra-ofensiva, ainda que com inestimáveis perdas e enormes dificuldades"(Apud Walter Faganiello Maierovitch, A Matriz Terrorista do Crime Organizado e o Fenômeno da Eversão. In: Justiça Penal 3 (críticas se sugestões) - O Crime Organizado (Itália e Brasil) A Modernização da Lei Penal, RT, São Paulo, 1995, p.90)

O magistrado italiano foi o primeiro a desvendar a transnacionalidade do crime organizado, orientando as investigações e a repressão nesse sentido. "Esta transnacionalidade, segundo entendia Falcone, significa, por um lado, multiplicação dos interesses e dos investimentos mafiosos para além das fronteiras dos seus países de origem; e, por outro lado, a integração crescente dos vários grupos criminosos do mundo inteiro numa rede interligada. Seria necessário então, no ver do juiz siciliano, seguir as fileiras e as conexões internacionais para poder atingir os centros do poder alternativo ao Estado, representado pelo poder mafioso. Fundamentando todo o procedimento judicial praticado por Falcone, esboçava-se um entendimento claro sobre a ameaça à democracia representada "pelo crescimento do poder subversivo dos grandes grupos criminosos, e da necessidade do recurso à cultura democrática para enfrentar - e vencer - o desafio do crescimento mundial da criminalidade organizada"(ver "home page" do instituto Brasileiro Giovanni Falcone ).

Senhoras e senhores Deputados, fazemos questão de lembrar a data do falecimento do juiz Giovanni Falcone com o intuito de não apenas homenagearmos tão notável figura humana que, como muitos outros, dentro e fora da Itália, pagaram com a própria vida o preço do bom combate, mas, sobretudo, e a partir da sua inestimável contribuição, fazer um alerta à Nação e chamar a atenção desta Casa, para a gravidade do problema do crime organizado no mundo e também no Brasil.

Em estudo elaborado pela American University, de Washington, para o Banco Mundial, sobre os recurso movimentados pelo crime organizado, chegou-se a astronômica quantia de US$1 trilhão (de dólares), semelhante ao Produto Interno Bruto do Canadá, a oitava economia do mundo. Os pesquisadores afirmam que a economia do crime está crescendo na proporção de 7% ao ano, o que significa que poderá dobrar a cada dez anos. Como a economia mundial tem crescido a uma média de 3,5% ao ano, dentro de algumas décadas o "Produto Criminoso Bruto"- como qualificou o fenômeno o jornal O Estado de São Paulo, em editorial (24.03.97) sobre o assunto - poderá estar se igualando às riquezas da economia produzida honestamente.

No caso específico do Brasil, o narcotráfico e o jogo do bicho representam apenas a parte mais visível e exposta do crime organizado. "As ligações entre a política e os negócios escusos, a reciclagem do dinheiro sujo, a penetração de capitais mafiosos em empresas legais e atividades lícitas, os investimentos num mercado financeiro hoje estabilizado mas ainda muito rentável, o tráfico de armas e de material nuclear, são alguns dos aspectos da inserção do Brasil na rede criminosa internacional, muito além e acima dos bandos, das quadrilhas, dos "Comandos" e das lideranças dos morros, às quais eles são geralmente atribuídos"(ver "home page" do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone ).

Como já foi dito alhures por uma pessoa que me é muito cara sobre outra pessoa que me foi próxima, mas da qual, infelizmente, já não posso compartilhar do convívio, "o que sobrevive é a produção consciente e socialmente significativa dos indivíduos. Quanto mais universal esta produção for, mais sobrevive, porque foi mais consciente e será mais significativa. Somente os seres individuais conscientes podem ter uma história singular socialmente significativa. Somente os seres humanos podem ter uma biografia. Quanto mais significativa e universal for a vida de um indivíduo, mais significativas e universais serão sua história singular e sua biografia. Uma das lições que a experiência negativa da morte nos ensina, é que somente o espírito, a consciência, é imortal. Aqui podemos escrever outra frase de Hegel: À vida do espírito não é a vida que se ausenta ante a morte e se mantém pura da desolação, mas é a vida que sabe afrontar a morte e manter-se vida"(Aldo Fornazieri, Nota sobre Adelmo Genro Filho. In: Filosofia e Praxis Revolucionária, Brasil Debates - Editora, São Paulo, 1988, p.102 e 103)

Senhoras e senhores Deputados, o trabalho do juiz Giovanni Falcone não findou com sua morte, mas imortalizou-se no seu exemplo que soube afrontar a morte e manter-se vida.

Muito Obrigado.

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